Aquamotor e touage Texto atualizado em 17 de Outubro de 2005 - 16h51 |
por Sílvio dos Santos * |
Caros leitores, Em continuidade ao relato da evolução da navegação fluvial na França, hoje iremos abordar os primeiros engenhos que foram utilizados para vencer a correnteza do rio Sena, pois a halage era restrita aos trechos próximos das vilas, necessitava também da via lateral para os cavalos andarem e a força exercida era sempre obliqua. Nos trechos com muitos meandros e margens alagadiças, a utilização da halage era impraticável. ************************* A idéia de utilizar as rodas de pás acionadas pela correnteza para tracionar o próprio barco ou outra embarcação é tão antiga quantos aos moinhos d’água. A exploração dessa idéia deu nascimento no século XVIII a diversas máquinas de puxar embarcações, as quais foram instaladas entre a Ponte Neuf (ponte nova) e a Ponte au Change ( ponte da troca) em Paris. Existiam dois tipos de tracionadores, os fixos e os móveis. Os fixos instalados nos moinhos d’água para puxar grandes embarcações ou sobre as pontes, estes com tração humana para pequenas embarcações, através de cabos manobrados pelos “chableurs” , os cabeiros. Les chableurs – Os cabeiros tracionado pequenas embarcações Os móveis, instalados sobre naves, que eram denominadas de aquamotores. O aquamotor enrolava seu próprio cabo de amaração no eixo de rotação da roda de pás, se deslocando até o ponto de fixação, tracionando um comboio composto por diversas peniches. Le Aquamoteur – O aquamotor – nave com rodas de pás que tracionava o cabo preso em um ponto fixo Após a invenção da máquina a vapor, os aquamotores foram substituídos por embarcações motorizadas que se deslocavam tracionando uma corrente colocada no leito do Sena. Essa operação era chamada de touage. O barco era simétrico e navegava nos dois sentidos, contra e a favor da correnteza, sempre tracionando de 3 a 4 peniches. A máquina a vapor puxava a corrente através de polias, as quais permitiam um rendimento melhor da potência instalada em comparação a tração animal, além da vantagem de ser axial ao deslocamento. A touage sob a Ponte de Notre Dame tracionando 3 peniches A partir de 1820, a primeira linha de touage é colocada em serviço pelo engenheiro Thourasse. Em 1845, uma linha de touage, a vapor em corrente contínua, ligava a Ponte de Tournelle, acima da Ponte de Notre Dame até a confluência do Rio Marne, totalizando uma distância de 6 km ao longo do Sena. Em 1855 as linhas de touage se expandiram atendendo Conflans de Sainte-Honorine, importante centro da battelerie, frota das peniches, a juzante de Paris, até a barragem de Suresnes, a montante de Paris, numa distância aproximada de 50 km. Le quai des grands Augustins – ponto de integração entre o Baixo e o Alto Sena Os comboios fluviais subiam e desciam o Rio Sena, havendo inclusive a integração entre os serviços da Compagnie Générale de Touage et Remorquage, a qual operava no baixo Sena, com a Compagnie de Touage de la Haute Siene, que operava no alto Sena. O ponto de integração era no braço de la Monnaie, ao lado da Ile de la Cite, onde se instalaram os escritórios das companhias de navegação, de seguros e de agenciamento de fretes assim como os cafés dos marinheiros. Atualmente esse local corresponde ao Quartier Latin, com seus famosos cafés e os bouquinistes vendendo seus velhos livros e pinturas ao longo do cais do Rio Sena, onde as peniches ainda continuam a navegar. Les bouquinistes – Os livreiros vendendo seus alfarrábios ao longo do cais do Rio Sena Referência bibliográfica: BEAUDOUIN, F. Paris e la batellerie du XVII au XX siécle. Paris: Editions Maritimes & D’Outre Mer, 1979. 32p. Henry, B.,Henry M. Voyageurs aux longs jours. Paris: Les Éditions Arthaud, 1982.216p. |
Navegação Fluvial
domingo, 6 de fevereiro de 2011
Aquamotor e touage
O transporte de madeira por flutuação
O transporte de madeira por flutuação Texto publicado em 10 de Outubro de 2005 - 10h17 |
por Sílvio dos Santos * |
Caros leitores, Em continuidade ao relato da evolução da navegação fluvial na França, hoje iremos abordar o transporte de madeira por flutuação, onde foi utilizada pela primeira vez uma técnica de logística: a unitização. ************************* A madeira foi importante na economia da França Antiga, como matéria-prima para a construção, para o mobiliário e para a carpintaria de carroças. Foi, também, o combustível por excelência para o aquecimento doméstico, para a panificação e para os usos industriais. Paris foi o mais importante centro consumidor de madeira e o desmatamento se estendeu pouco a pouco até áreas distantes da capital francesa. No fim do século XVIII, a madeira consumida vinha principalmente da região de Morvan pelo Alto Sena, Yonne e seus afluentes, graças a flutuação. Le flottage à bûches perdues à Clamecy vers 1880 – A flutua- ção à “lenha perdida” em Clamecy por volta de 1880. A flutuação era composta por duas fases sucessivas, a flutuação à “lenha perdida”, que era utilizada nos afluentes do rio Yonne, especialmente adequado para essa finalidade, e depois por flutuação “em comboio”, de Clamecy à Paris. Les débardeurs – Os desembarcadores Em Clamecy, a 250 km de Paris, os troncos de lenha, jogados nos pequenos afluentes à montante, eram retirados d’água, classificados por tamanho e dispostos em pilhas. Eram então agrupados em fardos ao longo de margens suaves que facilitassem a recolocação na água. Amarrados em comboios eram conduzidos até Paris, carregados pela correnteza. Construction d’un coupon de bois – Construção de um fardo de madeira. Nos períodos de estiagem, barragens eram abertas simultaneamente, para criar uma enchente artificial. Essa técnica, chamada de “navegação por eclusagem” ,fornecia a profundidade de água necessária para fazer flutuar as “jangadas” de madeira e a correnteza permitia um deslocamento “rápido” em direção à Paris, com uma velocidade aproximada de 5 km/h. Nos trechos estreitos do leito do rio, nas pontes e ilhas, ocorriam freqüentes choques entre os comboios e eventuais embarcações que estivessem na correnteza, ocasionando danos e atirando pessoas na água. Em Paris, os blocos de lenha eram retirados d’água para secagem e comercialização em mercados livres ao longo do Porto de Grève, próximo de Notre Dame. Port de Grève – Porto de Grève (Porto da Praia). Mercado livre nas margens do Rio Sena. Torre da Catedral de Notre Dame à direita da gravura. No primeiro plano à esquerda uma embarcação com tonéis de vinho. Port de Grève – Porto de Grève (Porto da Praia). Desembar- que de lenha, feno e cereais. Ponte de Notre Dame ao fundo no centro da gravura. No Brasil, essa prática também foi utilizada no Rio Uruguai, divisa de Santa Catarina e Rio Grande do Sul, no transporte dos troncos de araucárias, “pinheiros do Paraná”, até o porto de Buenos Aires, do final do século XIX até meados do século XX. No Canadá a flutuação ainda é utilizada para o transporte de madeira em toras até o Porto de Vancouver. Na Amazônia infelizmente esta pratica também é utilizada no contrabando de madeiras nobres, como o mogno e outras espécies em extinção. Referência bibliográfica: BEAUDOUIN, F. Paris e la batellerie du XVII au XX siécle. Paris: Editions Maritimes & D’Outre Mer, 1979. 32p. |
quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011
Início da navegação fluvial na França
O primeiro meio de transporte organizado na França Texto publicado em 03 de Outubro de 2005 - 15h58 |
por Sílvio dos Santos * |
Caros leitores,Nesta nova coluna, vou procurar contar à vocês, um pouco de história e conhecimento técnico sobre os meios de transporte, fluvial, ferroviário e marítimo, que eu tive a oportunidade de aprender durante minhas estadas na França. Hoje começamos pela navegação fluvial, que foi o primeiro meio de transporte a ser planejado e organizado desde a Idade Média. ******************** Muito antes da invenção da locomotiva – 1825 – e da abertura das primeiras estradas para as carruagens, a navegação fluvial já era utilizada como meio de transporte de pessoas e de cargas, na França Medieval. Privilegiada pela natureza, a França possui um relevo propício à navegação. Com exceção do Maciço Central, região de Auvergne, dos Alpes, junto à fronteira ítalo–suíça e ao sul, aos pés dos contrafortes dos Pirineus, pode – se navegar por toda a França. As primeiras eclusas datam da Idade Média e venciam desníveis de até dois metros. Os grandes rios, o Sena correndo para o Canal da Mancha; o Reno para o Mar do Norte e o Ródano para o Mediterrâneo, mesmo em trechos com correnteza eram utilizados. Aí navegaram os barcos de uma só viagem, que partiam dos pontos altos e desciam para Paris, Strasburgo e Marsellha, carregando cereais e vinhos. Como a volta era impossível, pois, à época, ainda não existiam motores, tais barcos eram desmontados e a madeira vendida como lenha, o combustível da época. Eclusa medieval em operação. Nos trechos suaves, os barcos venciam a pequena correnteza puxados por animais, que caminhavam em trilhas laterais aos rios. Esse procedimento, chamado de “hâlage”, era exercido pelos proprietários das terras marginais, pelo qual cobravam uma taxa. Daí a origem dos primeiros pedágios. “Péniche” sendo tracionada por “hâlage” No norte do país, em direção à Bélgica e Holanda, as “péniches”, nome popular dado à embarcação, navegavam à vela, movidas pelo mesmo vento que viravam os moinhos. “Péniche” à “voile”. No inicio do século XIX, a grande rede fluvial começa a ser ampliada. O então Ministro dos Transportes, Monsieur Freycinet, define a “péniche” padrão, que teria 5 metros de largura e 38,50 metros de comprimento e transportaria de 250 a 400 toneladas. A partir dessa resolução, as eclusas e canais construídos permitiam a passagem da “péniche” com o gabarito “freycinet". Eclusa gabarito “freycinet”. Por volta do 1850, a França já havia interligado as suas principais bacias hidrográficas com eclusas, pontes e túneis canais, elevadores, que ainda hoje são obras de orgulho da engenharia. Assim, quando a ferrovia começava a ser implantada, a navegação interior já interligava o Mediterrâneo ao Mar do Norte. “Péniche freycinet” aguardando a “hâlage” Com a invenção do navio a vapor em 1807, a navegação marítima teve um grande desenvolvimento. Entretanto, essa tecnologia só atingiu a navegação fluvial com a utilização dos comboios de chatas e rebocadores na segunda metade do século XIX. Na década de 20 do século XX, os motores diesel foram introduzidos nas “peniches”, tornando–as automotoras. Tal evento deu um grande impulso a “batellerie” – frota de “péniches” – que atingiu seu apogeu. Todavia, após a segunda Guerra, com a expansão das rodovias, a navegação fluvial começou também, a ser modernizada, pois seus canais, já centenários, não mais comportavam o tráfego crescente e suas “péniches” eram pequenas para o volume a ser transportado. Na época o Office National de la Navigation, organismo que regulamentava e planejava a navegação fluvial no território francês, começou a construir obras, que permitissem atingir os grandes portos fluviais, por embarcações de 3.000 toneladas e comboios de chatas de até 10.000 toneladas. Hoje, Paris, Lion, Strasbourgo e Basiléia, na Suíça, recebem pequenos navios denominados de flluvio–marítimos, que as ligam com os principais portos de mar da Europa. Nas ligações interiores as velhas “péniches” ainda prestam relevantes serviços e representam uma tradicional categoria profissional. A “Compagnie Nationale du Rhône”, que construiu e opera as eclusas do Rio Ródano, estuda o projeto da ligação com o Reno, para embarcações de grande gabarito. Na Europa, na década de 90, a Alemanha inaugurou a interligação do Reno ao Danúbio, através do Rio Main, que permite atingir os países do Leste Europeu e o Mar Negro. Nas últimas décadas, as “péniches” estão sendo utilizadas em duas atividades importantes. A primeira, na navegação de recreio, cruzando toda a Europa por canais tranqüilos e rodeados por paisagens campestres, em pequenos cruzeiros fluviais. A segunda, como residências ancoradas em recantos aprazíveis próximos das cidades. _____________________________ Referência bibliográfica: BEAUDOUIN, F. Paris e la batellerie du XVII au XX siécle. Paris: Editions Maritimes & D´Outre-Mer, 1979. 32p. |
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